Último dia em Angola. Tá tudo escuro. São 18h30 da tarde, a luz caiu, tô sozinha em casa porque hoje a Jú e eu nos dividimos para render mais. Por sorte o computador tá com bateria. Também não tem água.
Hoje de manhã fui à loja da Cia aérea TAAG confirmar nossas passagens. Sim! Aqui tem que ser pessoalmente. Fiquei uma hora só esperando. Quando fui atendida, a moça me falou que minha reserva tava cancelada, porque ainda não havia sido feita a confirmação e a minha classe (Econômica, claro) já estava cheia. Pra Jú tava tudo certo. Eu poderia resolver meu problema pagando um up grade para uma classe mais cara ou entrar pra lista de espera pro vôo de amanhã mesmo ou para o próximo, que é segunda (e também já está lotado).
Não me importaria em ficar mais um fim de semana, até gostaria. Mas fiquei nervosa porque meu visto vence em uma semana e é um saco se programar e ter que ficar alterando os planos. A moça dizendo "vamos esperar a resposta". Aí dramatizei: “É o seguinte, não tenho dinheiro para pagar up grade, meu visto vence dia 30 e terça, 27, é meu aniversario e minha família está a minha espera. Não sei se me informaram o procedimento errado, mas não minha culpa, a passagem tá paga e preciso viajar, tenho direito a um lugar”! Embarguei a voz e acho que ela se comoveu.
Foi lá dentro, voltou e disse que tava tudo certo, é só irmos fazer o check-in 4h30 da manhã. A partida está prevista para 8h30. Não me perguntem porque tão cedo, mas não vou arriscar, pretendemos estar lá no horário. Bem que haviam me falado dos rolos dessa TAAG. E pra quem reclamar, se a cia. aérea é do governo angolano?
Hoje também foi o primeiro dia em que andei sozinha de candonga. Fui lá no Gamek fazer uma entrevista. O bairro é meio favelão e me dei conta que nunca andei sozinha em um lugar tão pobre. É que nunca houve necessidade ou oportunidade. Mas não fiquei com medo, até porque pobreza não é sinônimo de perigo. Fiquei atordoada, a rua é movimentada e tava cheia de obras buracos. Pedi ajuda pras zungueiras e cheguei onde precisava. Foi engraçado, me perdi um pouco, me enchi de poeira mais que média e contei com a solidariedade das pessoas pra chegar onde precisava.
A Jú foi ao Congolenses e ao São Paulo, regiões bem movimentadas, pra não dizer tumultuadas, cheias de vendedores ambulantes. O Gomes, tio do Seba, foi com ela, assim como foi comigo na TAAG de manhã.
Nossos planos pra hoje à noite são comprar pizzas em uma pizzaria brasileira e nos despedir do Seba e seus amigos, da São (dona da casa em que estamos) e das suas filhas, nossos amores aqui, Raina e Janina. Mas continuo no escuro sozinha. Quer dizer, com a companhia da Úrsula, no gtalk enquanto a bateria do computador não acabar ou não der pau na internet.
Passei o dia pensando em um post de despedida, cheio de impressões e emoções, mas esse acabou sendo mais um diário de desabafo.
Essa última semana tem sido de perrengues e aventuras para confirmar que levamos uma vida tipicamente angolana. Como vou embora amanhã (pretendo, pelo menos), acabo dando risada de tudo. Mas penso e me dói, que vou voando pro meu país e essas pessoas – que não vejo mais como distantes africanos, mas amigos angolanos – vão continuar nessa realidade de não poder contar com o básico, de ter que se reiventar pra resistir a cada dia.
A Jú e o Gomes chegaram! O gerador foi ligado, já tem luz pelo menos. Hora de ir ver as pizzas.
Joana Neitsch