segunda-feira, 28 de junho de 2010

Almoço

Ontem cozinhamos pela primeira vez. A Jô tomou a frente na cozinha e eu fiquei na assessoria. Fizemos um frango com macarrão e molho de tomate que ficou uma delícia e aprovado também pelo Seba, nosso anfitrião muito exigente.

Organizar as coisas sem pia, nem torneira foi o mais difícil. Não tem água encanada na casa em que estamos. O sistema de abastecimento é da época dos portugueses, pouco mais de 30 anos.

Então usamos a água de um reservatório para cozinhar e depois fomos para o pátio de casa nos divertir com baldes de água para lavar a louça, à sombra de uma mangueira (esperamos que até final de julho alguma manga amadureça).

Perguntamos ao Seba, se ele se importava em contarmos isso no blog. Disse que não, "se ninguém falar, isso nunca vai mudar". Seba é designer e morou alguns anos fora de Angola, por conta do trabalho do pai. Estudou quando pequeno na Rússia e depois passou um tempo na Argélia. Nos contou que tomar banho de canequinha é o que tem dificuldade de se acostumar cada vez que volta de viagem para Luanda.


Juliana Passos

Cores de Luanda

Jú me disse que achou a cidade cinza e bege. Tentei nos explicar o porquê disso. Nessa época do ano, aqui é o cacimbo, estação que mais se aproxima do inverno. Continua calor, ontem vi 26° e 29° em termômetros na rua. À noite venta, é bom vestir um casaquinho. Entre junho e setembro chove pouco. O céu não fica bem azul, tem poucas nuvens, mas parece encoberto por uma neblina.
Além disso, tem a famosa reconstrução. Muitas obras, prédios inacabados ou mal conservados. Mais tonalidade cinza. E as muitas ruas barrentas, mesmo, as asfaltadas tem buracos e má conservação e fica a poeira no ar.

Não é só cinza e bege. As ruas de Luanda têm muita estampa colorida. Vestidos de senhoras mais velhas que insistem em vestir os tradicionais panos africanos, misturados com jovens miúdas e miúdos, que se preocupam em andar na moda. Moda que veem em canais de TV do Brasil. As cores estão impressas nas calçadas, onde se vendem bananas, roupas, lenços, pães, havaianas, amendoim, bacias, laranjas, o que houver para vender.

Mesmo no domingo à tarde os vendedoras estavam pelas ruas, com suas bacias na cabeça. E em pleno domingo à tarde já sentimos o trânsito de Luanda. Fila. Por sorte nossos amigos conheciam outras rotas e dessa vez escapamos de passar horas no trânsito. Foi sorte, aproveitamos para ver de longe a Baía de Luanda e tirar algumas fotos.

Aqui é difícil diferenciar quem é pobre ou classe média ou mesmo rico. As ruas que parecem de favela, saem em outras um pouco mais largas e calçadas, que têm tropas (policiais ou seguranças particulares) nas calçadas para cuidar das casas de pessoas importantes. Os tropas e os outros moradores também se distraem assistindo TV nas calçadas mesmo. Sábado à noite só dava uma novela mexicana, com aquelas encantadoras dublagens melodramáticas, pelas ruas que passamos.

A cor das ruas de Luanda também é de música. O familiar Martinho da Vila, as também familiares músicas de balada em inglês que aqui a gente ouve involuntariamente, como no Brasil, em sons altos de carros.

Um fim de semana e parece uma era. Muita informação. Muitas cores. E ainda não nos acostumamos à diferença de quatro horas do fuso.

Joana Neitsch

sábado, 26 de junho de 2010

A primeira gasosa


Cruzamos o oceano e chegamos. Simples assim. A Jú dormiu quase a viagem toda e Jô leu uma revista do mês passado que ainda não tinha lido.

Estávamos chegando e lembramos de olhar o mapa na televisãosinha que tem cada banco. O Atlântico para trás e uma círculo piscando em Luanda. Não é que conseguimos mesmo?
A gente meio sonolenta. Mas deu pra dizer “Jú estamos em Angola!”

Passamos na imigração. Simples, sem perguntas.

Pegamos as malas. Vieram três e demorou pra vir uma quarta da Jô. Logo veio, pronto.
Aí tinha a alfândega. Fomos perguntar a um funcionário se precisávamos declarar o nosso netbook. Ele chamou um outro colega. Nos perguntaram se é novo, falamos que sim, mas já que usamos (compramos na segunda passada, só para trazer para cá, mas isso nem dissemos). Aí eles disseram que não teríamos que declarar, era só entregar pra eles e passariam para o outro lado por dentro da roupa. Para isso, claro, teríamos que dar-lhes uma gasosa (como se chama gorjeta ou propina). Nos pediu 100 dólares. Falamos que tínhamos pouco dinheiro, o que trouxemos íamos pegar no banco depois. Disseram então que ficariam com o computador e depois buscávamos e pagávamos.

A Jú se saiu melhor que Jô, que já tava com a voz trêmula a essas alturas. Perguntou a angolanas na fila se precisava pagar mesmo. Elas disseram que computador pessoal não. Resolvemos ir para fila e dissemos que preferíamos fazer tudo certinho. Ele nos disse que aqui não é São Paulo, não dá pra querer ser tão correto. Permanecemos na fila e eles não tiraram os olhos de nós.

Um outro funcionário com expressão menos ameaçadora nos disse para entrar na fila do “nada a declarar” porque é um só computador e pessoal. Passamos sem pagar nada a ninguém. Os funcionários que haviam nos pedido a gasosa nos deram tchau e desejaram boa sorte. Foram lá para fora e a Jô cismou que iam nos armar alguma coisa.

Nos plantamos no meio do aeroporto. Logo, o Seba, nosso anfitrião angolano chegou. Deu vontade de abraçá-lo como se fosse um parente que não víamos a muito tempo. O susto passou, nos transmitiu confiança.

Agora já estamos muito bem alojadas. Fomos ao mercado Jumbo fazer umas compras. Almoçamos um delicioso feijoada feitos pela Dona Lídia, que trabalha na casa do Sebas (ela já trabalhou com brasileiros da Odebrecht e disse que conhece nossos gostos). Trocamos dólares, colocamos créditos no celular. Tudo com ajuda do nosso anfitrião e dos seus amigos Maga e Ernani.

Podemos dizer: mães estamos vivas e muito bem!

A primeira gasosa não foi dessa vez, não em dinheiro. A Jú se rendeu a uma Coca-Cola gelada (na garrafa de vidro!) depois de sete anos na abstinência.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Boa viagem


Às vezes a gente vai longe só pra se encontrar. Vamos pra Angola pra encontrar um Brasil longe de casa, encontrar história da África não no que nos contam do passado, mas no que ela nos mostra do presente. Fome, desigualdade, miséria, problemas sociais encontramos em muitos cantos e metrópoles do Brasil. Alegria e povo resistente também.

Vamos em busca de ver mais que isso, vamos em busca do olhar, o olhar de jornalista que ainda estamos aprendendo. Buscamos o olhar da vida que quase nos escapa...

Fazer um retrato do país Angola, da cidade Luanda não nos é possível em um mês. Quem poderá fazê-lo e em quanto tempo?

Presenciar os encontros, se espantar e se encantar com os contrastes são nossas ambições.

É um clichê dizer que após 30 anos de Guerra Civil, Angola está sendo reconstruída. E aí? Como se reconstrói? De onde vem matéria prima, mão de obra e vontade?

O Brasil foi o primeiro reconhecer sua independência. O que fazem as empresas brasileiras que no país do outro lado do Atlântico? O que fazem famílias inteiras que deixam o conforto de país aspirante a grande potência mundial? O que fazem jovens profissionais recém-formados em Angola? O que fazem duas estudantes de Jornalismo?

Pode ser que nossas histórias mais perturbem que esclareçam.

A viagem começou há quase um ano em um projeto para o Trabalho de Conclusão ousado para duas garotas pouco experientes na profissão e na vida, com pouco dinheiro.

E agora, aqui de Guarulhos, a duas horas do embarque.

Joana e Juliana


Foto: Duas desesperadas criando o blog no posto Telefônico em Guarulhos, resquícios do fim de semestre da Faculdade e ansiedade bombando